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  • Foto do escritorAdriana Leite

Crise nas Big Techs: oportunidade ou quebradeira do setor?

Atualizado: 17 de abr. de 2023

Grandes empresas da área de tecnologia já demitiram mais de 100 mil pessoas no mundo


Desemprego: os cortes de postos de trabalho atingem até gigantes como o Google e fazem parte de ajuste do setor.

Nas últimas décadas, as grandes corporações da área de tecnologia e comércio eletrônico se transformaram em marcas extremamente valiosas e puxaram a economia mundial. Quem não deseja (ou desejava) trabalhar na Amazon, Alphabet (dona do Google), Microsoft, Dell, Spotify, Facebook ou Twitter? Mas desde o final do ano passado, o eldorado das big techs vem desmoronando com demissões em massa que já somam mais de 100 mil pessoas no mundo.


Qual o impacto desse movimento na cadeia global de tecnologia? Como essa crise afeta as empresas nacionais e de regiões como Campinas – considerada o Vale do Silício brasileiro? A crise das big techs traz oportunidades ou vai provocar uma quebradeira geral em todo o ecossistema mundial de tecnologia?


O Notas Econômicas ouviu especialistas e economistas para mostrar que nem é bem ao céu ou à terra que a crise das big techs se desenrola. Na opinião da maioria dos entrevistados, os cortes de postos de trabalho são parte de um ajuste depois do boom de contratações e do crescimento vertiginoso do setor durante a pandemia nos anos de 2020 e 2021.


A crise sanitária obrigou empresas e trabalhadores a investirem em tecnologia para manter os sistemas produtivos, de vendas e prestação de serviços que giram a roda da economia mundial. As bigs techs e toda a cadeia de tecnologia cresceram como nunca e era óbvio que chegaria um momento que essa bolha iria estourar.


Por outro lado, as demissões também podem trazer oportunidades para que as empresas de pequeno e médio porte contratem profissionais gabaritados. O setor vive, em países como o Brasil, uma escassez de mão de obra qualificada. Além disso, com a falta de trabalhadores, os profissionais são muito disputados pelo mercado e os salários são inflados pela lei da oferta e da procura, segundo os empregadores. Agora, esse cenário deve mudar.


A notícia ruim é que o temor dos investidores da contaminação da crise das big techs na cadeia de produção de tecnologia pode fechar a torneira dos recursos que alimentam os sonhos de empreendedores, de startups e de quem ainda precisa de financiamento para escalar. Não basta mais uma boa ideia. Será preciso um plano muito sólido e, de fato certeiro, para atrair o dinheiro.


Furo da bolha da pandemia


Os especialistas consultados pelo Notas Econômicas afirmam que a crise das big techs não é motivo de preocupação exacerbada e que o próprio setor mantém o otimismo com projeções de crescimento. Contudo, é preciso, sim, observar o mercado para detectar oportunidades e antever desafios criados a partir do furo da bolha após o boom da pandemia. Nos últimos dias, todos estão atentos à quebra de bancos que financiavam empresas do setor nos Estados Unidos.


O diretor de Inovação e Empreendedorismo do CPQD, Paulo José Pereira Curado, afirma que o cenário atual é um ajuste natural do mercado após as gigantes mundiais do setor inflarem bastante, a partir de expectativas geradas durante a pandemia.

“O setor passa por uma acomodação natural após o boom gerado durante a pandemia de recursos humanos e mesmo de insumos com uma corrida para atender a demanda do mercado. A crise nas big techs, apesar de mexer com o mercado gerando um ajuste natural, também oferece oportunidade para as empresas contratarem mão de obra qualificada e apresentarem projetos inovadores e eficazes para resolver problemas reais”, comenta Curado.


O professor da Faculdade de Economia da PUC-Campinas, Paulo Ricardo da Silva Oliveira, diz que é necessário situar a crise atual. Ele observa que, desde o início de 2022, nota-se nos resultados das gigantes da tecnologia uma redução das atividades. “Havia uma clara desaceleração das receitas. Parte desse reflexo veio da expectativa criada durante a pandemia de um cenário promissor e de forte crescimento para os próximos anos. Essa projeção não se confirmou”, aponta.


Oliveira afirma que a vacinação que freou o contágio e as mortes pela Covid-19 gerou o retorno para o trabalho presencial de milhões de pessoas em todo o mundo. Outro fator que pesou para o recuo da alta vertiginosa do consumo de produtos e serviços de tecnologia foi a escalada da subida das taxas de juros em diversos países, incluindo no maior mercado do mundo que é os Estados Unidos.


“Além desses dois fatores que frustraram as expectativas das big techs, tem ainda o acirramento da concorrência com novos entrantes como o TikTok e o ChatGPT, que vêm de fora desse seleto grupo que domina o mercado. Eles ameaçam a posição dessas empresas. É inevitável que elas repensem as estratégias operacionais, de produtos e de serviços”, analisa o economista.

Impacto nos investimentos


Cusnir: "Recursos serão para projetos viáveis"

Com o crescimento mundial do mercado de tecnologia, o Brasil vinha se beneficiando do interesse dos investidores por startups, empresas inovadoras e de alta tecnologia nacionais. O CEO da Diletta Solutions, Michel Cusnir, observa que o país estava apenas começando a aprender a lidar com investidores sérios. A empresa dele é especializada em auxiliar startups a desenvolverem suas plataformas de negócios. A Diletta é uma empresa-filha da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).


“Durante muito tempo, as empresas dependiam muito de investimento público, que era muitíssimo pouco efetivo, e de investidores aventureiros. Realmente, é uma pena que a crise tenha vindo agora. Ela vai gerar, sim, um impacto. Porém, acho que os investidores vão só ser mais criteriosos com as investidas buscando negócios que sejam sustentáveis no médio prazo. Vai ficar mais difícil conseguir dinheiro para projetos que não tenham um plano viável de monetização”, alerta.


Para o executivo, se a análise sobre a crise das big techs for apenas do momento presente, a situação vai parecer assustadora. Entretanto, se a avaliação for por um período mais longo de tempo, os cortes de postos serão vistos como um ajuste natural do mercado de tecnologia.


“Durante a pandemia, as empresas de tecnologia viveram épocas de vacas gordas. Muita receita on-line, muito investidor com apetite e pessoas sendo contratadas com pouco critério, gerando uma explosão de salários que chegava a inviabilizar algumas startups que estavam iniciando. Se você for olhar agora, as demissões não superam as contratações durante a pandemia. O que acontece é que com a freada do crescimento do on-line e do remoto, as empresas estão aproveitando para ajustar salários e orçamentos”, opina Cusnir.


Ele acrescenta que hoje existe uma crise de liquidez no mercado. “Mas ela também é um reflexo do excesso de investimento que aconteceu no momento anterior. Já estamos vendo o mercado se acalmar e as empresas voltando a crescer em um ritmo mais racional”, conclui o CEO da Diletta Solutions.


Empresas-Filhas da Unicamp


Positivo: empresas-filhas da Unicamp geraram 44.624 empregos diretos em 2022 e R$ 19,3 bilhões em faturamento.

O ecossistema de inovação da Região de Campinas conta com vários modelos diferentes para fomentar a alta tecnologia. A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) tem a Agência de Inovação da Unicamp (Inova), a Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Unicamp (Incamp) e inúmeros projetos nos institutos e centros de pesquisa da instituição.


A coordenadora de Empreendedorismo e Ambientes de Inovação da Inova Unicamp, Mariana Zanatta Inglez, afirma que o ecossistema de inovação e empreendedorismo ao redor da Unicamp é formado pelo relacionamento tanto entre as empresas-filhas da Unicamp cadastradas quanto entre elas e a comunidade que aspira empreender ou firmar parcerias com empresas estabelecidas no mercado ou que desejam se relacionar com a Unicamp.


“As formas de relacionamento com a universidade são diversas, desde o acesso a mão de obra altamente qualificada e pesquisadores de excelência, ao licenciamento de tecnologias e convênios de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Empresas de diversos portes e startups que desejam se conectar ainda mais com esse ecossistema têm a opção de se instalar no Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, e empresas nascentes podem receber suporte da Incamp, que ajudam a transformar ciência e tecnologia em negócios disruptivos”, diz Mariana Zanatta Inglez.

A coordenadora informa que, segundo o último relatório publicado pela Inova Unicamp, ao todo, compõem o ecossistema empreendedor da universidade 1.293 empresas-filhas cadastradas, sendo que 1.061 delas estão ativas. Dentro do recorte das empresas ativas, 13 são de grande porte com faturamento superior a R$ 300 milhões por ano – entre elas estão as unicórnios Quinto Andar, o Grupo Movile (dono do iFood) e o Grupo Safira da área de energia.


De acordo com o relatório da Inova, outras 62 empresas-filhas são spin-offs (empresas criadas para viabilizar um negócio a partir dos resultados de pesquisas ou conhecimentos desenvolvidos na Universidade). Juntas as empresas-filhas da Unicamp geraram 44.624 empregos diretos e faturaram R$ 19,3 bilhões, conforme dados do relatório de 2022.


Quebradeira de bancos


Não bastassem as demissões em massa, as tech agora temem a quebradeira de bancos que financiam empresas do setor nos Estados Unidos. O temor é geral de que a crise se alastre, mas o governo americano entrou em ação rápido para tentar barrar uma onda de choque no sistema financeiro e nas empresas de alta tecnologia.


Nesta última semana, o Silicon Valley Bank e o Silvergate Capital anunciaram falência dos bancos. Especialistas afirmam que isso vai afetar, sim, e muito, a vida das empresas de tecnologia e ainda há um risco de impactar negativamente o mercado de crédito e bancário americano e, por consequência, o sistema financeiro em outras partes do mundo.


Toda a cadeia de tecnologia e conhecimento está atenta aos desdobramentos dos cortes de pessoal e investimentos nas big techs, e na quebradeira de instituições financeiras que atuam com as empresas do setor. Como sempre dizia a minha avó: "Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém". E o setor vai precisar bastante desse conselho até o cenário se estabilizar.


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